A novela “Amor de Mãe” terá a sua exibição suspensa da grade da Globo a partir da próxima segunda-feira (23) devido às medidas da emissora para conter a disseminação do novo coronavírus. Em seu lugar, será exibida uma reprise especial de “Fina Estampa”, trama de Aguinaldo Silva.
No término dessa “primeira fase”, neste sábado (21), Thelma (Adriana Esteves) será o destaque, já que terá uma passagem sem volta, segundo a autora Manuela Dias. “Normalmente, vemos uma vilã durante toda a novela e no final ela se humaniza. Com Thelma estamos vendo o nascimento da vilã. Quando se vê encurralada pela possibilidade de perder seu bem maior [o filho Danilo], ela é capaz de fazer qualquer coisa. Perde freios sociais e afetivos que fazem com que nos importemos com os outros”, diz a autora.
Nessa última semana, Thelma já sabe que criou como seu o filho tirado de sua melhor amiga, Lurdes (Regina Casé). A ameaça de ter esse segredo desvendado ficou ainda maior com a chegada de Rita (Mariana Nunes), que vai se prontificar a ajudar Lurdes a encontrar Domênico e, por causa disso, terá um final trágico.
Apesar do ajuste da emissora para criar uma espécie de final de temporada, Valmir Moratelli, pesquisador de teledramaturgia e doutorando da PUC-Rio, diz que a pausa poderá sim prejudicar a novela. Segundo ele, o público desse tipo de produto gosta de ver tudo em sequência e pode “esfriar” com uma pausa de semanas ou meses.
“Não dá pra imaginar se as pessoas vão amar Lurdes da mesma maneira, elas perdem aderência pelo tempo que ficam distantes. A novela deixa de ser o produto principal na rotina do telespectador”, aponta Moratelli, que sugere, inclusive, um tipo de especial para recordar o público de tudo que passou antes da segunda fase.
O fato é que o retorno não tem data para acontecer. Para Adriana Esteves, será um período em que o “público ficará mais na expectativa do que nunca. Isso será uma novidade na história das telenovelas. E o desfecho da trama na segunda fase será melhor ainda”, afirma ela, sem dar qualquer pista do que virá.
Moratelli tem duas apostas para esquentar a segunda fase da novela: Betina (Isis Valverde), que agora ficou rica e tem possibilidade de se mostrar mais na trama; e a relação de Danilo (Chay Suede) com as mãe, a que o criou e que ele descobrirá que o comprou quando criança, e a biológica, que ele conhece hoje como sogra.
Sobre a revelação, Regina Casé confessa que já perdeu o sono algumas vezes imaginando a cena em que descobrirá que Danilo é seu filho Domênico. “Não há grito ou choro que eu faça que seja do tamanho que eu espero e que todo mundo espera. Tenho medo do momento também porque a Lurdes gosta tanto da Thelma.”
Apesar das ótimas críticas e até mesmo um aumento na audiência nas últimas semanas, atingindo picos de 37 pontos na Grande SP , como na última quarta (18), segundo Kantar Ibope -cada ponto representava 74,9 mil lares)-, há quem veja essa pausa como uma oportunidade também de “Amor de Mãe” ser repensada e ganhar novos rumos.
“A audiência atual é mais um reflexo do momento. O próprio Jornal Nacional está tendo altos índices de audiência, porque são as pessoas em casa buscando informação. ‘Amor de Mãe’ tem uma estética, uma linguagem que fogem do que o público está habituado”, diz Claudino Mayer, doutor em teledramaturgia pela USP (Universidade de São Paulo).
Para ele, o fato de a autora optar por não colocar um vilão óbvio desde o início da trama e não manter um núcleo de comédia foge das características clássicas das novelas. “A autora está percebendo que está chato, mas não está conseguindo virar por causa da estrutura dos personagens. Quem sabe na segunda fase…”
Moratelli, porém, não vê essas características como ruins. “‘Amor de Mãe’ tem mostrado qualidade estética muito interessante, diferente de outras novelas, mas ainda mantém características habituais dos folhetins. Tem uma fotografia de filme, linguagem de série, mas tem a mocinha sofredora.”
“Em ‘Amor de Mãe’ você vê as pequenas vilanias do dia a dia de uma forma mais aprazível de assistir e até capaz de entender dentro de um contexto. Você tem, sim, a mocinha sofredora atrás do filho, o moço que tenta conquistar o coração da amada. Mas em outros pontos, principalmente técnicos, ela [a novela] é um marco”, avalia.
A volta de Pereirão e Crô
Com a suspensão de “Amor de Mãe”, a Globo trará de volta a sua programação, a partir de segunda (23) a novela “Fina Estampa” (2011-2012), com personagens icônicos, como a Pereirão (Lilia Cabral) e Crô (Marcelo Serrado) e um toque de humor muito maior do que o encontrado na atual trama das 21h.
Escrita por Aguinaldo Silva, “Fina Estampa” mostra a história de duas mulheres muito diferentes: Tereza Cristina (Christiane Torloni) e Griselda (Lilia Cabral), essa última apelidada de Pereirão, que se encontram e acabam se tornando rivais, primeiro pelo envolvimento de seus filhos e, depois, por causa de Renê (Dalton Vigh).
Para Claudino Mayer, doutor em teledramaturgia pela USP, “Fina Estampa” traz uma história leve, de fácil compreensão e com histórias de superação. “Ela foge da realidade, do nosso cotidiano. Ela é mais entretenimento, o que é importante para esse momento de tensão [por conta do avanço do coronavírus]. Ela dá uma oportunidade de o público relaxar.”
Além disso, o folhetim já deu certo com o público na primeira vez, tendo alcançado média de 39,1 pontos na Grande SP (cada ponto do Ibope representava na época 67 mil lares), segundo a coluna Telepadi. “Amor de Mãe”, por exemplo, marcou média de 34 pontos na semana passada (cada ponto representava 74,9 mil lares).
Valmir Moratelli, pesquisador de teledramaturgia e doutorando da PUC-Rio, destaca, no entanto, que uma fórmula que deu certo antes pode não dar tão certo agora. “‘Fina Estampa’ era o reflexo de outra época. Não dá pra colocá-la em outro momento e achar que vai dar na mesma. As coisas mudaram desde então.”
“A Griselda era uma mulher forte, que cuidou sozinha dos filhos, fazendo um trabalho que até então seria de homem. Ela foi muito importante naquele momento, a gente tinha a primeira presidente mulher no Brasil, e discutia qual era o papel da mulher na sociedade. Mas a discussão pode ser outra hoje”, afirma o pesquisador.
Mesmo o personagem Crô, que fez sucesso e chegou a ganhar dois filmes, em 2013 e 2018, Moratelli descreve como caricato demais para os tempos atuais. “Era uma bicha afetadíssima, que não representa a realidade da diversidade sexual. Depois dele já veio o Félix (Mateus Solano), de ‘Amor à Vida’ (2013-2014), que tinha profissão, núcleo familiar, se apaixonou. Essas coisas são importantes para humanizar o personagem. O Crô parece que saiu de Zorra Total de antigamente.”
Uma instituição nacional
Com a suspensão das gravações de novelas como forma de reduzir o risco de disseminação do novo coronavírus, a Globo decidiu trazer a sua programação alguns antigos sucessos. Para Valmir Moratelli, esse é um acontecimento inédito na televisão brasileira.
Para ele, as suspensões ou reduções de novelas até hoje foram provocadas pela censura, na época da ditadura, como ocorreu com “Roque Santeiro”, em 1975, ou por problemas como morte no elenco ou queda de audiência. “Mas parar toda uma cadeia de produção, inclusive novelas em pré-produção, é inédito na TV brasileira.”
“É importante essa mensagem da Globo. A partir do momento que ela tira do ar seu principal produto, mostra a todos que é uma situação séria. A novela é uma instituição nacional extraoficial. Quantas gerações não foram criadas na frente da TV. O que a gente percebe é que o problema chegou na ficção”, avalia.
“Amor de Mãe” é a primeira novela a deixar a grade de programação da Globo desde o anúncio de mudanças por conta do Covid-19. Antes disso, já tinham sido suspensos programas como Mais Você, apresentado por Ana Maria Braga, Encontro com Fátima Bernardes e Se Joga, para aumentar o tempo do jornalismo.
Outra novela que será interrompida é “Salve-se Quem Puder”, que dará lugar à reprise de “Totalmente Demais” (2015-2016) a partir de 30 de março, mesmo dia em que volta “Novo Mundo” (2017) para a faixa das 18h após a conclusão de “Éramos Seis”. “Malhação – Todas as Formas de Amar” segue até abril, quando será sucedida por “Malhação – Viva a Diferença” (2017-2018).
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