A notícia de que mais de 200 pessoas, maioria da Bahia, foram resgatados de trabalho semelhante a escravidão na cidade de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, chocou o país. O empresário Pedro Santana, 45 anos, natural de Valente, no Região do Sisal na Bahia, entrou na mira da polícia por ser o principal aliciador das pessoas.
Em parceria com o jornal NB Notícias, de Bento Gonçalves, o Jornal do Sisal fez uma série de matérias sobre os desdobramentos do resgate. O Ministério Publico do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) juntamente com a Polícia Federal (PF) auxiliaram no resgate.
O homem natural de Salvador, casado e pai de três filhos, recebeu uma proposta de emprego tentadora: R$ 3 mil, com as viagens de ida e volta custeadas, alimentação e o alojamento durante 45 dias. Mas viu que nada foi como o prometido, tendo que até que custear a alimentação da viagem. Ele relata que assim que chegou em Bento foram colocados para trabalhar.
“Acordávamos 4h da manhã para às 5h, no máximo, estarmos saindo para os parreirais. Parávamos de colher às 19h30 e, até o transporte vir, chegávamos no alojamento quase meia-noite, porque os parreirais eram longe e tinha muita gente para pegar”, relata o trabalhador.
Eles saíram de Valente e desembarcaram na Serra Gaúcha em janeiro, todos com contratos assinados com boa condição de trabalho. A realidade foi outra: longas jornadas de trabalho, péssimas condições do alojamento, pressão psicológicas, traumas e alimentação estragada, um sofrimento inimaginável.
“Trabalhávamos sob pressão o tempo todo no alojamento. E para que a pressão se tornasse mais firme ainda, eles vinham com ameaças e agressões. Tive vários colegas agredidos. Fui esgoelado porque compartilhei uma panela de milho com os colegas. Não tinha culpa de nada. Éramos xingados e humilhados mesmo. Falavam que baiano bom era baiano morto”, comenta Fernando.
Alguns deles relataram as cenas de torturas que passaram, mas tiraram a responsabilidade dos produtores rurais que, segundo eles, os tratavam bem. Todo o dinheiro era passado para a empresa que os contrataram, mas não era repassado para eles.
“Não recebemos nada e se precisássemos de dinheiro para enviar para a família ou para comprar alguma comida diferente – no único mercado que podíamos comprar – precisávamos pegar dinheiro com um agiota que colocava juros de 50%,” conta um dos trabalhadores.
As pessoas resgatadas afirmam que a humilhação era constante. “O chefe da equipe disse que vivíamos na Bahia comendo bosta, e quando chegamos aqui queríamos comer caviar. Ele falava isso na frente dos produtores. Não viemos de lá comendo bosta. Não somos ricos, mas temos dignidade. Lá tem vagas de emprego, mas buscávamos uma oportunidade melhor para dar uma ajuda para a família. Chegar aqui e escutar o próprio cara que nos contratou para trabalhar dizendo que vivíamos lá comendo bosta foi muito humilhante”, relata.
O principal aliciador dos trabalhadores é natural de Valente, na Região do Sisal. Pedro Oliveira Santana chegou a ser preso, mas ficou apenas 10 horas na delegacia prestando depoimento aos policiais. Ele foi solto após pagar fiança de R$ 39 mil. “A revolta é ver que o cara que teve chance de mudar tudo isso viu que poderia chegar nesse ponto e não fez nada. Agora as consequências vão vir”, destaca um dos trabalhadores.
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